Quando a equação econômico-financeira inicial se assenta em bases antieconômicas, ocorre violação ao princípio da economicidade desde a origem contratual. Nesse caso, não há que se falar em ato jurídico perfeito nem em direito adquirido à manutenção de situação lesiva aos cofres públicos.

Embora as empresas estatais estejam dispensadas de licitar a prestação de serviços relacionados com seus respectivos objetos sociais (art. 28, § 3º, inciso I, da Lei 13.303/2016), devem conferir lisura e transparência a essas contratações, em atenção aos princípios que regem a atuação da Administração Pública, selecionando seus parceiros por meio de processo competitivo, isonômico, impessoal e transparente.

Licitação que tenha por objeto a locação de bem imóvel juntamente com serviços de segurança, manutenção, limpeza e conservação (solução imobiliária completa), contidos na taxa condominial, não representa, por si só, violação ao art. 23, § 1º, da Lei 8.666/1993, haja vista que esse dispositivo não traz regra absoluta, devendo ser avaliado, caso a caso, se o parcelamento é vantajoso ou não para a Administração.


PLENÁRIO

 

Quando a equação econômico-financeira inicial se assenta em bases antieconômicas, ocorre violação ao princípio da economicidade desde a origem contratual. Nesse caso, não há que se falar em ato jurídico perfeito nem em direito adquirido à manutenção de situação lesiva aos cofres públicos.

Auditoria realizada nas obras de construção da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), localizada no Município de Ipojuca, no Estado de Pernambuco, identificou como achado a “adoção de critério de medição inadequado ou incompatível com o objeto real pretendido (‘verba de chuvas’)” nos contratos principais da Rnest. O achado dizia respeito à inadequação dos critérios definidos no Anexo XV desses contratos, incluído com a finalidade de regulamentar o ressarcimento, pela Petrobras, dos custos decorrentes da paralisação das frentes de serviços em virtude da ocorrência de chuvas, descargas atmosféricas e suas consequências. A equipe de auditoria identificou inconsistências nesse anexo, aptas a gerar pagamentos indevidos às contratadas, principalmente porque o anexo adotou custos horários operativos dos equipamentos para ressarcir as horas não operativas dos mesmos equipamentos, o que seria um contrassenso técnico, já que “as máquinas, quando paradas por conta das chuvas, desligam os motores”. Em sede de oitiva, um dos consórcios contratados sustentou que uma eventual modificação do ‘anexo de chuvas’ por determinação do TCU implicaria indevida quebra do equilíbrio econômico-financeiro, tendo em vista que o anexo “comportaria cláusulas econômicas, as quais deveriam ser protegidas contra alterações”. Em seu voto, o relator concordou com a unidade técnica no sentido de que havia um desequilíbrio econômico-financeiro de origem no aludido anexo contratual, decorrente do não atendimento de diversos aspectos relativos à boa técnica de orçamentação. Nesse quadro, em que o equilíbrio econômico-financeiro inicial se assentou em bases ilegitimamente antieconômicas, não haveria direito dos particulares à sua preservação. Considerando o descumprimento do princípio da economicidade desde a origem contratual, não haveria que se falar em ato jurídico perfeito nem em direito adquirido à manutenção de situação lesiva aos cofres da Petrobras. O relator também ressaltou ter havido decisão antieconômica da Petrobras na própria licitação, uma vez que a estatal excluiu, dos preços contratuais, a previsão de custos relacionados às intempéries climáticas. As empresas proponentes formularam, então, propostas comerciais sem a previsão das chuvas, significando, na prática, que a Petrobras assumiu o risco da ocorrência das intempéries climáticas. Ao final, o relator propôs e o Plenário decidiu assinar prazo para que a Petrobras anulasse os anexos contratuais denominados “Procedimento para avaliação e pagamento por ocorrência de chuvas, descargas atmosféricas e suas consequências”, sem prejuízo de expedir determinação à entidade para a quantificação da indenização devida às contratadas, segundo os critérios especificados pela unidade técnica. Foi ainda determinado à Petrobras que “abstenha-se de prever, em seus instrumentos contratuais, o pagamento de indenização às contratadas em virtude da ocorrência de chuvas e descargas atmosféricas”, haja vista o “farto histórico de ineficiências e sobrepreço verificado nos contratos que contemplaram tal metodologia”.

Acórdão 2007/2017 Plenário, Levantamento, Relator Ministro Benjamin Zymler.


 Embora as empresas estatais estejam dispensadas de licitar a prestação de serviços relacionados com seus respectivos objetos sociais (art. 28, § 3º, inciso I, da Lei 13.303/2016), devem conferir lisura e transparência a essas contratações, em atenção aos princípios que regem a atuação da Administração Pública, selecionando seus parceiros por meio de processo competitivo, isonômico, impessoal e transparente.

Denúncia formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades na Telecomunicações Brasileiras S.A. (Telebrás), relacionadas à minuta do Edital de Chamamento Público 1/2017, que visa selecionar empresa para comercializar a capacidade satelital em banda Ka do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC). Os denunciantes alegaram que a versão preliminar do edital não continha estimativa de preço, em afronta ao disposto no art. 7º, § 2º, da Lei 8.666/1993, que condiciona o procedimento licitatório à existência de “orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os custos unitários”. A seguir, argumentaram que a Lei 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, exige a divulgação do preço mínimo quando for adotado o critério de julgamento com base na maior oferta. Ademais, defenderam que a comercialização do SGDC não configuraria um produto ou serviço relacionado com os objetos sociais da Telebrás, razão por que a comercialização da infraestrutura de telecomunicações não se enquadraria na exceção contida no art. 28, § 3º, da Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais). Em seu voto, o relator assinalou que, ao contrário do que fora sustentado pelos denunciantes, nem a Lei 8.666/1993 nem a Lei 12.462/2011 serviram de base para o referido chamamento público. O procedimento fora adotado com respaldo no art. 28, § 3º, inciso I, da Lei 13.303/2016, segundo o qual as empresas estatais estão dispensadas de licitar a prestação de serviços relacionados com seus respectivos objetos sociais. E ao prover a infraestrutura de telecomunicação, a Telebrás estaria a atuar diretamente no domínio econômico, conforme preceitua o art. 173 da Constituição Federal, exercendo atividades finalísticas que lhe cabem por força de seu estatuto. Nesse sentido, o procedimento de chamamento público sob comento não configuraria um procedimento licitatório. Na verdade, trata-se de um “mecanismo elaborado pela empresa com o fito de, em atenção aos princípios que regem a atuação da Administração Pública, conferir lisura e transparência ao processo, não se vinculando à Lei Geral de Licitações nem a qualquer outro diploma semelhante”. E arrematou: “embora realizando atividade finalística própria de seu objeto social, a Telebrás não detém uma discricionariedade irrestrita para escolher quem quiser, mesmo sendo dispensável a licitação. Ao contrário, deve ser realizado um processo competitivo isonômico, impessoal e transparente, com observância dos princípios constitucionais”. Em conformidade com esse entendimento, teria então a Telebrás decidido realizar um chamamento público, precedido por uma audiência pública, com o objetivo de “expor à sociedade os mecanismos adotados para selecionar parceiros para atender aos usuários finais dos serviços de telecomunicações”. Por derradeiro, o relator esclareceu que, no exercício de suas competências discricionárias e visando obter o maior valor possível pela cessão temporária do direito de uso de capacidade satelital, a Diretoria da Telebrás e o Conselho de Administração da empresa determinaram o estabelecimento de um preço de reserva, chamado na denúncia de preço mínimo, valor que será mantido em sigilo até o momento em que for declarado o vencedor do certame, com o intuito de dificultar possíveis combinações de preços entre os participantes do chamamento público. Ao final, o relator propôs e o Plenário decidiu considerar improcedente a denúncia.

 Acórdão 2033/2017 Plenário, Denúncia, Relator Ministro Benjamin Zymler.


 Licitação que tenha por objeto a locação de bem imóvel juntamente com serviços de segurança, manutenção, limpeza e conservação (solução imobiliária completa), contidos na taxa condominial, não representa, por si só, violação ao art. 23, § 1º, da Lei 8.666/1993, haja vista que esse dispositivo não traz regra absoluta, devendo ser avaliado, caso a caso, se o parcelamento é vantajoso ou não para a Administração.

Representação formulada por licitante questionou concorrência promovida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), destinada à locação de bem imóvel para abrigar sua sede em Brasília/DF, conforme detalhamento constante do projeto básico integrante do instrumento convocatório. Entre outras possíveis irregularidades, apontou a representante “inobservância ao parcelamento do objeto, uma vez que a licitação tem como objeto a locação de imóvel, com diversas obrigações acessórias, não relacionadas à atividade imobiliária, sem a comprovação da vantajosidade sobre a contratação parcelada, restringindo o caráter competitivo do certame, em desacordo com o art. 37, caput, da Constituição Federal (CF), bem como com a Lei 8.666/1993”. Analisando o mérito, após as oitivas regimentais e a suspensão cautelar da licitação, registrou o relator, consoante jurisprudência do TCU, que “a disposição do art. 23, § 1º, da Lei 8.666/1993 não traz uma regra absoluta pelo parcelamento ou não do objeto, devendo ser avaliado, caso a caso, se o parcelamento é benéfico ou não para a administração”. No caso concreto, prosseguiu, “as alegações referentes à obrigatoriedade do parcelamento e a consequente restrição a competitividade não merecem prosperar”. É que o ICMBio procurava “não apenas um imóvel para instalação de sua sede, o qual posteriormente, irá adaptar e prover, por si, os serviços necessários à segurança, conservação e manutenção, mas uma solução imobiliária completa, plenamente adaptada as suas necessidades e com suprimento dos serviços de segurança, conservação e manutenção pelo locador”. No que respeita à economicidade da modalidade de contratação proposta, anotou o relator que consta dos autos informação técnica dando conta de que seu custo seria significativamente inferior ao do atual contrato. Quanto à competitividade da licitação, restou evidenciada a participação de oito empresas no certame, que ofertaram seis imóveis na configuração proposta, afastando qualquer alegação de restrição ao caráter competitivo do certame. Ademais, lembrou o relator que o atual contrato já comporta configuração similar à adotada na licitação em curso, com pequenas variações. Nada obstante, fez registrar o relator que o projeto básico da concorrência não atende aos requisitos do inciso IX do art. 6º da Lei 8.666/1993, por não trazer “todos os elementos necessários e suficientes para se avaliar com precisão o custo da prestação desses serviços e seu impacto na taxa condominial”. Nesses termos, e considerando a informação de que o ICMBio prorrogara a vigência do atual contrato de locação de sua sede por mais sessenta meses, julgou o Plenário parcialmente procedente a representação, revogando a medida cautelar concedida, e determinando ao ICMBio que “na hipótese de dar continuidade à concorrência 1/2016, com fundamento no art. 21, § 4º, da Lei 8.666/1993, republique o edital contendo as especificações referentes aos serviços condominiais a serem prestados pelo locador, nos termos do art. 15 da IN MPOG 2/2008”.

Acórdão 2020/2017 Plenário, Representação, Relator Ministro-Substituto Weder de Oliveira.

 

[youtube-subscriber channelID=UC1hJugZblbtt_KAA1u5n4VA layout=full subscribers=default]
Print Friendly, PDF & Email
Compartilhe a informação: